No princípio do século passado, Portugal vivia um momento de agitação política iniciado em 1906, quando o rei Carlos I e o príncipe herdeiro foram assassinados e Dom Manuel subiu ao trono. Mas isso não acalmou os opositores da realeza, que decidiram então empreender um movimento revolucionário cujo desfecho foi a deposição do novo rei e a implantação do sistema republicano de governo no país. Porém, todo mundo sabe o que a linguagem corrente entende por revolução: uma ação armada que tem como objetivo a substituição violenta dos detentores do poder, geralmente trazendo em sua esteira a morte, a mutilação e a ruína de gente que se envolveu na disputa às vezes contra sua própria vontade, ou então porque infelizmente estava no meio do caminho.
No caso de Portugal, as regras determinavam que feridos e aleijados não podiam ser deslocados para o campo de batalha, princípio que pouco a pouco foi sendo estendido aos que precisavam suar o rosto para ganhar o pão-nosso-de-cada-dia. Assim, como a simulação de que alguém não tinha ou um, ou os dois braços, transformou-se em razão para afastá-lo das obrigações de trabalho, os gozadores da época aproveitaram a farsa em moda e criaram a expressão "dar uma de João sem-braço" , que passou a ser aplicada em todas as situações onde o cidadão apresentava alguma desculpa meio marota para justificar o descumprimento de compromissos, a intenção de não assumir responsabilidades, ou qualquer ação praticada com esperteza mal-intencionada. Muita gente continua fazendo isso até hoje, principalmente quando o objetivo visado são as aposentadorias indevidas e indenizações fantásticas pagas por nosso pródigo INSS.
O nome João é muito popular e certamente essa é a razão pela qual está presente em inúmeras expressões usadas em nossa linguagem, como é o caso de “joão-ninguém”, designação dada ao indivíduo pobre, ignorante e sem nenhuma importância, e de “joão-bobo”, apelido aplicado às pessoas demasiadamente ingênuas e inocentes, e que, por sinal, serve como título para uma das histórias infantis do escritor dinamarquês Hans Christian Andersen (1805-1845), recontada pela brasileira Ana Maria Machado. Quanto à expressão “João-sem-Braço”, o professor Deonísio da Silva sugere que ela provavelmente tenha surgido de “comentários de homens anônimos que alegavam nada poder fazer, quando solicitados a trabalhar”, esclarecendo que “como Portugal formou-se a partir de sucessivas guerras travadas em seu próprio território, eram muitos os feridos e aleijados que, por sua condição, estavam impedidos de trabalhar, os primeiros temporariamente, e os outros para o resto de suas vidas, em muitos casos. Simular não ter um ou os dois braços constituiu-se em escusa para fugir ao trabalho e a outras obrigações. Não demorou e a expressão ‘dar uma de joão-sem-braço’ migrou para o rico, sutil e complexo reino da metáfora, aplicando-se a diversas situações em que a pessoa se omite, alegando razão insustentável”.
FERNANDO KITZINGER DANNEMANN
Amiga adoro suas edições.
ResponderExcluirContinue sempre nos presenteando com tuas descobertas.
Beijocas
Sonya